Interpretação Bíblica

Capítulo Sete (Chapter Seven)

Paulo escreveu a Timóteo:

Atente bem para a sua própria vida e para a doutrina, perseverando nesses deveres, pois, agindo assim, você salvará tanto a si mesmo quanto aos que o ouvem (1 Tm. 4:16, ênfase adicionada).

Cada ministro deve levar essa admoestação ao coração, prestando muita atenção, primeiramente em si mesmo, para ter certeza que está deixando um exemplo de santidade.

Segundo, ele dever prestar atenção aos seus ensinamentos, porque sua salvação eterna e daqueles que o ouvem depende daquilo que ensina, assim como Paulo escreveu no versículo citado acima.[1] Se um ministro adota uma doutrina falsa ou negligencia falar a verdade às pessoas, o resultado poderá ser eternamente desastroso para ele e outros.

Contudo, não há desculpas para o ministro fazedor de discípulos ensinar falsas doutrinas, já que Deus o deu o Espírito Santo e Sua Palavra para guiá-lo na verdade. Em contraste, muitos ministros com motivos errados simplesmente repetem os ensinos populares de outros, não estudam a Palavra por si só, e estão aptos a errar em suas doutrinas e ensinos. Um meio de proteção contra isso é o ministro purificar seu coração, para ter certeza que seus motivos são (1) agradar a Deus e (2) ajudar as pessoas a se prepararem para ficar diante de Jesus, ao invés de se tornarem ricas, poderosas ou populares. Adicionalmente, ele deve estudar a Palavra de Deus diligentemente para que tenha um entendimento total e balanceado. Paulo também escreveu a Timóteo:

Procure apresentar-se a Deus aprovado, como obreiro que não tem do que se envergonhar e que maneja corretamente a palavra da verdade (2 Tm. 2:15).

Ler, estudar e meditar na Palavra de Deus deveria ser uma disciplina que um ministro pratica continuamente. O Espírito Santo o ajudará a entender melhor a Palavra de Deus enquanto estuda diligentemente, assegurando assim que irá “lidar fielmente com a palavra da verdade.” Um dos maiores problemas na igreja hoje é que ministros interpretam incorretamente a Palavra de Deus e consequentemente iludem as pessoas que ensinam. Isso pode ser bem sério. Tiago advertiu:

Meus irmãos, não sejam muitos de vocês mestres,j pois vocês sabem que nós, os que ensinamos, seremos julgados com maior rigor (Tg. 3:1).

Por esse motivo, é necessário que o ministro fazedor de discípulos saiba como interpretar corretamente a Palavra de Deus, com o alvo de entender perfeitamente e comunicar o significado planejado de qualquer texto.

Interpretar corretamente a Palavra de Deus é feito do mesmo modo que interpretar corretamente as palavras de qualquer um. Se quisermos entender corretamente o significado planejado de qualquer autor ou pregador, precisamos aplicar certas regras de interpretação, regras que são baseadas em senso comum. Nesse capítulo, vamos considerar as três regras mais importantes de interpretação bíblica honesta. Elas são, (1) Ler inteligentemente, (2) Ler pelo contexto e (3) Ler honestamente.

Regra no1: Leia inteligentemente. Interprete o que você lê literalmente a não ser que o entendimento figurado ou simbólico seja obviamente intencional.

As Escrituras, como toda literatura, é cheia de figuras de linguagem, como metáforas, hipérboles e antropomorfismos. Elas devem ser interpretadas como tais.

Uma metáfora é uma comparação de similaridades entre duas coisas diferentes. As Escrituras contém muitas metáforas. Uma pode ser encontrada nas palavras de Cristo durante a última ceia.

Enquanto comiam, Jesus tomou o pão, deu graças, partiu-o, e o deu aos seus discípulos, dizendo: “Tomem e comam; isto é o meu corpo”. Em seguida tomou o cálice, deu graças e o ofereceu aos discípulos, dizendo: “Bebam dele todos vocês. Isto pe o meu sangue da aliança, que é derramado em favor de muitos, para perdão de pecados” (Mt. 26:26-28).

Jesus quis dizer que o pão que deu aos Seus discípulos era literalmente Seu corpo e que o vinho que beberam era literalmente Seu sangue? O senso comum nos diz Não. As Escrituras nos dizem claramente que era pão e vinho que Jesus os deu, e não diz nada deles terem transformado literalmente, em carne e sangue em algum ponto. Nem Pedro nem João, presentes na última ceia, reportaram tal coisa em suas epístolas, e é muito improvável que os discípulos tenham brincado de representar os papéis de canibais!

Alguns argumentam: “Mas Jesus disse que o pão e o vinho eram Seu corpo e sangue, então eu vou acreditar no que Jesus disse!”

Jesus disse uma vez que Ele era a porta (veja João 10:9). Ele literalmente se transformou em uma porta com dobradiças e uma maçaneta? Jesus disse que era uma videira e que nós éramos os ramos (veja João 15:5). Ele literalmente se transformou em uma videira? Nós nos tornamos literalmente em ramos de videira? Jesus disse que era a luz do mundo e o pão que veio do céu (veja João 9:5; 6:41). Jesus também é a luz do sol e um pão de forma?

Claramente, todas essas expressões são figuras de linguagem chamadas metáforas, uma comparação entre duas coisas diferentes mas que compartilham algumas similaridades. De alguns modos, Jesus era como uma porta e uma videira. As frases de Jesus na última ceia eram obviamente metáforas também. O vinho era como Seu sangue (em alguns pontos). O pão era como Seu corpo (em alguns pontos).

As Parábolas de Cristo (Christ’s Parables)

As parábolas de Cristo são símiles, que são como metáforas; símiles, entretanto, sempre têm a palavra como. Elas também ensinam lições espirituais através das semelhanças entre duas idéias. Esse é um ponto importante para se lembrar enquanto as interpretamos; caso contrário podemos cometer o erro de procurar significado em cada pequeno detalhe de cada parábola. Metáforas e símiles sempre chegam ao ponto onde as similaridades acabam e as diferenças começam. Por exemplo, se eu disser à minha esposa: “Seus olhos são como lagos,” eu quero dizer que seus olhos são azuis, profundos e convidativos. Eu não quero dizer que peixes nadam neles, que pássaros pousam neles e que eles congelam durante o inverno.

Vamos levar em consideração três das parábolas de Jesus, todas símiles, a primeira sendo a Parábola da Rede:

O Reino dos céus é ainda como uma rede que é lançada ao mar e apanha toda sorte de peixes. Quando está cheia, os pescadores a puxam para a praia. Então se assentam e juntam os peixes bons em cestos, mas jogam fora os ruins. Assim acontecerá no fim desta era. Os anjos virão, separarão os perversos dos justos e lançarão aqueles na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes (Mt. 13:47-50).

O céu e uma rede são basicamente a mesma coisa? Absolutamente não! Eles são muito diferentes, mas existem algumas similaridades. Assim como os peixes são separados em duas categorias, bons e ruins, quando puxados da rede, assim será no reino de Deus. Um dia o perverso e o justo, que agora estão vivendo juntos, serão separados. Mas é aí que as similaridades acabam. Peixes nadam, pessoas andam. Pescadores separam peixes. Anjos separarão os perversos dos justos. Peixes são julgados por quão gostosos eles são depois de preparados. Pessoas são julgadas por sua obediência ou desobediência a Deus. Peixes bons são colocados em recipientes e peixes ruins são jogados fora. Os justos herdam o reino de Deus e os perversos são lançados no inferno.

Essa parábola é um exemplo perfeito de como cada metáfora e símile é uma comparação imperfeita porque as coisas que estão sendo comparadas são diferentes. Não queremos ir além da intenção do orador, assumindo que as diferenças são na verdade similaridades. Por exemplo, nós sabemos que “peixes bons” acabam sendo preparados no fogo, e “peixes ruins” voltam para a água para nadar por mais um dia. Jesus não mencionou isso! Teria ido contra Seu propósito.

Essa parábola em particular não ensina (independente do que dizem) uma estratégia de “evangelismo de rede,” onde tentamos arrastar todos para dentro da igreja, bons ou ruins, queiram eles vim ou não! Essa parábola não ensina que a praia é o melhor lugar para evangelizar. Essa parábola não prova que o arrebatamento da igreja acontecerá no fim do tempo de tribulações. Ela não ensina que nossa salvação é uma escolha puramente divina de Deus porque os peixes escolhidos na parábola nada tinham a ver com o motivo de sua seleção. Não force significados sem garantia às parábolas de Jesus!

Permanecendo Preparado (Remaining Ready)

Aqui temos outra parábola familiar de Jesus, a Parábola das Dez Virgens:

O Reino dos céus será, pois, semelhante a dez virgens que pegaram suas candeias e saíram para encontrar-se com o noivo. Cinco delas eram insensatas, e cinco eram prudentes. As insensatas pegaram suas candeias, mas não levaram óleo. As prudentes, porém, levaram óleo em vasilhas, junto com suas candeias. O noivo demorou a chegar, e todas ficaram com sono e adormeceram. À meianoite, ouviu-se um grito: “O noivo se aproxima! Saiam para encontrá-lo!” Então todas as virgens acordaram e prepararam suas candeias. As insensatas disseram às prudentes: “Dêem-nos um pouco do seu óleo, pois as nossas candeias estão se apagando”. Elas responderam: “Não, pois pode ser que não haja o suficiente para nós e para vocês. Vão comprar óleo para vocês”. E saindo elas para comprar o óleo, chegou o noivo. As virgens que estavam preparadas entraram com ele para o banquete nupcial. E a porta foi fechada. Mais tarde vieram também as outras e disseram: “Senhor! Senhor! Abra a porta para nós!” Mas ele respondeu: “A verdade é que não as conheço!” Portanto, vigiem, porque vocês não sabem o dia nem a hora (Mt. 25:1-13)!

Qual é a lição principal dessa parábola? É encontrada na última sentença: Fiquem preparados para o retorno do Senhor, pois Ele pode demorar mais do que vocês esperam. É só isso.

Como já mencionei em um capítulo anterior, Jesus contou essa parábola para alguns de Seus discípulos mais íntimos (veja Mt. 24:3; Mc. 13:3), que estavam obviamente seguindo-o aquela hora. Então, está claramente indicado nessa parábola o fato que era possível que Pedro, Tiago, João e André não estivessem preparados quando Jesus voltasse. É por isso que Jesus estava os avisando. Portanto, essa parábola ensina que há uma possibilidade que aqueles que estão atualmente preparados para a volta de Cristo podem não estar preparados quando Ele realmente voltar. Todas dez virgens estavam inicialmente prontas, mas cinco se tornaram despreparadas. Se o noivo tivesse voltado mais cedo, todas dez teriam entrado na festa nupcial.

Mas qual é o significado de existirem cinco virgens tolas e cinco sábias? Isso significa que somente metade dos crentes professos estarão prontos quando Cristo retornar? Não.

Qual é o significado do óleo? Ele representa o Espírito Santo? Não. Ele revela que somente aqueles que foram batizados no Espírito Santo entrarão no céu? Não.

O noivo ter chegado à meia-noite revela que Jesus voltará na mesma hora? Não.

Porque o noivo não pediu para que as noivas sábias identificassem suas amigas tolas na porta? Se tivesse pedido para que as sábias identificassem as tolas, teria arruinado o propósito da parábola, já que as tolas teriam entrado.

Talvez possa ser dito que assim como as noivas tolas não tinham mais luz e foram dormir, assim os salvos tolos começarão a andar na escuridão espiritual e irão dormir espiritualmente, levando-os no final, à sua condenação. Talvez uma similaridade possa ser encontrada na festa nupcial da parábola e a futura festa nupcial do Cordeiro, mas isso é o mais longe que alguém pode ir sem forçar significado a essa parábola ou a seus vários detalhes.

Dando Fruto (Bearing Fruit)

Talvez a pior interpretação que já ouvi de uma das parábolas de Cristo foi a explicação de um pregador da Parábola do Joio. Primeiramente, vamos ler essa parábola:

Jesus lhes contou outra parábola, dizendo: “O Reino dos céus é como um homem que semeou boa semente em seu campo. Mas enquanto todos dormiam, veio seu inimigo e semeou o joio no meio do trigo e se foi. Quando o trigo brotou e formou espigas, o joio também apareceu. Os servos do dono do campo dirigiram-se a ele e disseram: ‘O senhor não semeou boa semente em seu campo? Então, de onde veio o joio?’ ‘Um inimigo fez isso’, respondeu ele. Os servos lhe perguntaram: ‘O senhor quer que o tiremos?’ Ele respondeu: ‘Não, porque, ao tirar o joio, vocês poderão arrancar com ele o trigo. Deixem que cresçam juntos até a hora da colheita. Então direi aos encarregados da colheita: ‘Juntem primeiro o joio e amarrem-no em feixes para ser queimado; depois juntem o trigo e guardem-no no meu celeiro’” (Mt.13:24-30).

Aqui está aquela explicação do certo pregador:

É um fato que quando o trigo e o joio brotam, são idênticos. Ninguém pode dizer se são trigo ou joio. É exatamente assim no mundo e na igreja. Ninguém pode dizer quem são os verdadeiros cristãos e quem são os ímpios. Eles não podem ser identificados por suas vidas, porque muitos cristãos não estão obedecendo a Cristo, assim como os perdidos. Somente Deus conhece seus corações, e Ele os selecionará no final.

É claro que esse não é o propósito da Parábola do Joio! Na realidade, ela ensina que os salvos são muito distinguíveis de não salvos. Note que os servos percebem que joio foi plantado quando trigo deu fruto (veja v. 26).O joio não dá fruto, e assim é facilmente identificado como tal. Eu acho significante que Jesus tenha escolhido joio estéril para representar os perversos que irão ser selecionados no final e lançados no inferno.

As ideias principais dessa parábola são claras: Os verdadeiramente salvos dão fruto; os não salvos, não. Mesmo que Deus ainda não esteja julgando os perversos enquanto vivem entre os salvos, um dia Ele os separará dos santos o os lançará no inferno.

Na verdade, Jesus deu explicações dessa parábola em particular, então não há necessidade de procurarem mais significados além do que Ele explicou:

Então ele deixou a multidão e foi para casa. Seus discípulos aproximaram-se dele e o pediram: “Explica-nos a parábola do joio no campo”. Ele respondeu: “Aquele que semeou a boa semente é o Filho do homem. O campo é o mundo, e a boa semente são os filhos do Reino. O joio são os filhos do Maligno, e o inimigo que semeia é o Diabo. A colheita é o fim desta era, e os encarregados da colheita são os anjos. Assim como o joio é colhido e queimado no fogo, assim também acontecerá no fim desta era. O Filho do homem enviará os seus anjos, e eles tirarão do seu Reino tudo o que faz tropeçar e todos os que praticam o mal. Eles os lançarão na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes. Então os justos brilharão como o sol no Reino de seu Pai. Aquele que tem ouvidos, ouça (Mt. 13:37-43)

Hipérbole (Hyperbole)

Uma Segunda figura de linguagem encontrada na Bíblia é a hipérbole. Uma hipérbole é um exagero intencional feito para ênfase. Quando uma mãe diz a um filho: “Eu te chamei mil vezes para jantar,” isso é uma hipérbole. Um exemplo de hipérbole na Bíblia seria a frase de Jesus sobre cortar sua mão direita:

E se a sua mão direita o fizer pecar, corte-a e lance-a fora. É melhor perder uma parte de seu corpo do que ir todo ele para o inferno (Mt. 5:30).

Se Jesus quis dizer literalmente que todos que pecassem com sua mão direita devessem cortá-la fora, então todos estaríamos sem a mão direita! É claro que o problema com o pecado não está em nossas mãos. É mais provável que Jesus estava nos ensinando que o pecado pode nos mandar para o inferno, e a forma de evitar o pecado é removendo tentações e coisas que nos causam a tropeçar.

Antropomorfismo (Anthropomorphism)

Uma terceira figura de linguagem que encontramos nas Escrituras é o antropomorfismo. Trata-se de uma expressão metafórica onde características humanas são atribuídas a Deus para nos ajudar a entendê-Lo. Por exemplo, lemos em Gênesis 11:5:

O Senhor desceu para ver a cidade e a torre que os homens estavam construindo (Gn. 11:5).

Isso é provavelmente um antropocentrismo porque não parece provável que o Deus onisciente teria que literalmente viajar do céu à Babel para investigar o que as pessoas estavam construindo!

Muitos acadêmicos bíblicos consideram todas menções bíblicas sobre partes do corpo de Deus, como Seus braços, mãos, nariz, olhos e cabelo, como antropocentrismos. Com certeza eles dizem, o Deus todo-poderoso não tem tais partes como os humanos.

Contudo, eu descordaria por vários motivos. Primeiro, porque as Escrituras dizem claramente que nós fomos feitos a imagem e semelhança de Deus:

Então disse Deus: “Façamos o homem à nossa imagem , conforme a nossa semelhança” (Gn. 1:26a, ênfase adicionada).

Alguns dizem que fomos criados à imagem e semelhança de Deus só a respeito de nosso autoconhecimento, responsabilidade moral, capacidade de pensar e assim por diante. Contudo, vamos ler uma frase que é muito parecida com Gêneses 1:26, que está apenas alguns capítulos à frente:

Aos 130 anos, Adão gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem; e deu-lhe o nome de Sete (Gn. 5:3, ênfase adicionada).

Com certeza isso significa que Sete era muito parecido com seu pai fisicamente. Se for isso que Gênesis 5:3 quer dizer, certamente a expressão idêntica significa a mesma coisa em Gênesis 1:26. Senso comum e interpretação honesta dizem que sim.

Mais adiante, temos algumas descrições de Deus por autores bíblicos que O viram. Moisés, por exemplo, juntamente com outros setenta e três israelitas, viram a Deus:

Moisés, Arão, Nadabe, Abiu e setenta autoridades de Israel subiram e viram o Deus de Israel, sob cujos pés havia algo semelhante a um pavimento de safira, como o céu em seu esplendor. Deus, porém, não estendeu a mão para punir esses líderes do povo de Israel; eles viram a Deus, e depois comeram e beberam (Ex. 24:9-11, ênfase adicionada).

Se você tivesse perguntado a Moisés se Deus tivesse pés, o que ele teria dito?[2]

O profeta Daniel também teve uma visão de Deus Pai e Deus Filho:

Enquanto eu olhava, tronos foram colocados, e um ancião [Deus Pai] se assentou. Sua veste era branca como a neve; o cabelo era branco como a lã. Seu trono era envolto em fogo, e as rodas do trono estavam em chamas. De diante dele, saía um rio de fogo. Milhares de milhares o serviam; milhões e milhões estavam diante dele. O tribunal iniciou o julgamento, e os livros foram abertos… Em minha visão à noite, vi alguém semelhante a um filho de homem [Deus Filho], vindo com as nuvens dos céus. Ele se aproximou do ancião e foi conduzido à sua presença. Ele recebeu autoridade, glória e o reino; todos os povos, nações e homens de todas as línguas o adoraram. Seu domínio é um domínio eterno que não acabará, e seu reino jamais será destruído (Dn. 7:9-10. 13-14, ênfase adicionada).

Se você tivesse perguntado a Daniel se Deus tinha cabelo branco e uma forma, pela qual Ele pode sentar em um trono, o que ele teria dito?

Tudo isso sendo verdade, eu estou convencido que Deus Pai tem uma forma gloriosa que é de certa forma similar a forma de um ser humano, mesmo Ele não sendo de carne e sangue, e sim espírito (veja Jo 4:24).

Como você pode dicernir quais partes das Escrituras devem ser interpretadas literalmente e quais devem ser interpreradas figurativamente ou simbolicamente? Isso deve ser fácil para qualquer um que possa raciocinar logicamente. Interprete tudo literalmente a menos que não haja outra alternativa inteligente a não ser interpretar figurativamente ou simbolicamente. Os profetas do Velho Testamento e o livro de Apocalipse, por exemplo estão claramente, cheios de simbolismo, alguns dos quais são explicados e outros não. Mas não é difícil identificar os simbolismos.

Regra no2: Leia pelo contexto. Cada passagem deve ser interpretada na luz das passagens ao seu redor e da Bíblia inteira. O contexto cultural e histórico também deve ser considerado sempre que possível.

Ler as escrituras sem levar em consideração seu contexto imediato e bíblico é talvez a causa principal de má interpretação.

É possível fazer com que a Bíblia fale qualquer coisa que você quiser se isolar versículos de seus contextos. Por exemplo, você sabia que a Bíblia diz que Deus não existe? Em Salmos 14 podemos ler: “Deus não existe” (Sl. 14:1). Contudo, se quisermos interpretar essas palavras fielmente, devemos lê-la dentro do contexto: “Diz o tolo em seu coração: ‘Deus não existe’” (Sl. 14:1, ênfase adicionada). Agora esse versículo tem um significado completamente novo!

Outro exemplo: uma vez eu ouvi um pregador fazer um sermão na necessidade dos cristãos serem “batizados no fogo.” Ele começou ser sermão lendo as palavras de João Batista de Mateus 3:11: “Eu os batizo com água para arrependimento. Mas depois de mim vem alguém mais poderoso do que eu, tanto que não sou digno nem de lavar as suas sandálias. Ele os batizará com o Espírito Santo e com fogo.”

Ele preparou um sermão baseado nesse único versículo. Eu lembro dele dizer: “O fato de você ter sido batizado no Espírito Santo não é suficiente! Jesus também quer te batizar no fogo, assim como João Batista proclamou!” E ele continuou, explicando que uma vez fossemos “batizados no fogo,” ficariamos cheios de zelo pelo trabalho do Senhor. Finalmente ele fez um apelo para aqueles que quisessem ser “batizados no fogo.”

Infelizmente, aquele pregador em particular cometeu o erro clássico de tirar um versículo de seu contexto.

O que João Batista quis dizer quando disse que Jesus os batizaria com fogo? Para encontrar a resposta, tudo que temos a fazer é ler dois versículos antes daquele e um depois. Vamos começar com os dois anteriores. João disse:

Não pensem que vocês podem dizer a si mesmos: “Abraão é nosso pai”. Pois eu lhes digo que destas pedras Deus pode fazer surgir filhos de Abraão. O machado já está posto à raiz das árvores, e toda árvore que não der bom fruto será cortada e lançada ao fogo (Mt. 3:9-10, ênfase adicionada).

Primeiro, nós aprendemos que, naquele dia, parte da audiência de João consistia de judeus que achavam que sua salvação era baseada em sua linhagem. Portanto, o sermão de João era evangelístico.

Depois, também descobrimos que João os estava advertindo que pessoas não-salvas corriam perigo de ser lançadas no fogo. Parece razoável concluír que “o fogo” do qual João falava no versículo 10 é o mesmo do versículo 11.

Esse fato se torna ainda mais claro quando lemos o versículo 12:

Ele traz a pá em sua mão e limpará sua eira, juntando seu trigo no celeiro, mas queimará a palha com o fogo que nunca se apaga (Mt. 3:12, ênfase adicionada).

Em ambos versículos 10 e 12, o fogo ao qual João se referia era o fogo do inferno. No versículo 12, ele fala metaforicamente que Jesus dividirá as pessoas em dois grupos — trigo, que Ele juntará “no celeiro,” e palha, que queimará “com o fogo que nunca se apaga.”

À luz dos versículos ao redor, João devia querer dizer no verspiculo 11 que Jesus iria batizar as pessoas com o Espírito Santo, se fosse salvos, ou com fogo, se não fosse. Já que esse é o caso, ninguém deve pregar a cristãos dizendo que devem ser batizados no fogo!

Indo além do contexto imediato desses versículos, também devemos olhar para o resto do Novo Testamento. Podemos encontrar um versículo em Atos que diz que cristãos estavam sendo “batizados no fogo”? Não. O mais perto é a descrição de Lucas do dia do Pentecostes quando os discípulos foram batizados no Espírito Santo e línguas de fogo apareceram temporariamente sobre suas cabeças. Mas Lucas nunca disse que esse era um “batismo no fogo.” Mais adiante, podemos encontrar alguma exortação ou instrução nas epístolas para os cristãos serem “batizados no fogo”? Não. Portanto, é seguro concluír que nenhum cristão deve buscar um batismo no fogo.

Um Evangelho Falso Derivado das Escrituras (A False Gospel Derived From Scripture)

Muitas vezes, o próprio evangelho é máu interpretado por pregadore e professores que, por não considerarem o contexto, interpretam as Escrituras erroneamente. Falsos ensinos a respeito da graça de Deus são abundantes por esse motivo.

Por exemplo, o relato de Paulo sobre a salvação ser o produto da graça e não de obras, encontrado em Efésios 2:8, tem sido abusado para promover um falso evangelho, tudo porque o contexto foi ignorado. Paulo escreveu:

Pois vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus; não por obras para que ninguém se glorie (Ef. 2:8-9).

Muitos focam exclusivamente no relato de Paulo sobre a salvação ser pela graça, um presente e não um resultado de obras. Disso, contrário ao testemunho de centenas de passagens, eles dizem que não há conexção entre salvação e santidade. Alguns vão tão longe a ponto de dizer que o arrependimento não é necessário para a salvação. Esse é um exemplo clássico de como as Escrituras são má interpretadas pelo contexto ser ignorado.

Primeiramente, vamos considerar o que a passagem em si diz inteiramente. Paulo, não diz que fomos salvos pela graça, mas que fomos salvos pela graça por meio da fé. A fé faz tanto parte da equação da salvação quanto a graça. As Escrituras declaram que a fé sem obras é inútil, morta e não pode salvar (veja Tg. 2:14-26). Portanto, Paulo não está ensinando que a santidade é irrelevante na salvação. Ele está dizendo que não somos salvos por nossas próprias forças; a base de nossa salvação é a graça de Deus. Nunca poderiamos ser salvos sem a graça de Deus, mas é somente quando respondemos com fé à graça de Deus é que a salvação acontece em nossas vidas. O resultado da salvação é sempre obediência, o fruto da fé genuína. Isso é provado se olharmos o contexto, que está no versículo seguinte. Paulo diz:

Porque somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus preparou antes para nós as praticarmos (Ef. 2:10).

O único motivo de termos sido regenerados pelo Espírito Santo e agora sermos novas criaturas em Cristo era para que pudessemos andar em boas obras e obediência. Portanto, a equação de salvação de Paulo é assim:

Graça + Fé = Salvação + Obediência

Isto é, graça mais fé é igual (ou resulta em) salvação mais obediência. Quando a graça de Deus é respondida com a fé, o resultado é sempre a salvação e boas obras.

Mesmo assim, aqueles que arrancaram as palavras de Paulo de seu contexto fizeram uma fórmula assim:

Graça + Fé – Obediência = Salvação

Isto é, graça mais fé sem (ou menos) obediênci é igual (ou resulta em) salvação. Isso é heresia de acordo com a Bíblia.

Se lermos um pouco mais do contexto das palavras de Paulo, também descobriremos que a situação em Éfeso era a mesma que em todos os lugares que Paulo pregava. Isto é, judeus estavam ensinado aos novos convertidos gentios de Paulo, que precisavam ser circuncidados e tinham que praticar algumas cerimonias da Lei Mosaica se quisessem ser salvos. Era dentro do contexto de circuncisão e trabalhos cerimoniais que Paulo tinha em mente quando escreveu sobre as “obras” que não nos salvam (veja Ef. 2:11-22).

Se lermos um pouco mais adiante, entendendo mais do contexto da carta de Paulo aos Efésios, vemos claramente que Paulo acreditava que santidade era essencial para a salvação.

Entre vocês não deve haver nem sequer menção de imoralidade sexual como também de nenhuma espécie de impureza e de cobiça; pois essas coisas não são próprias para os santos. Não haja obsenidade, nem conversas tolas, nem gracejos imorais, que são inconvenientes, mas, ao invés disso, ações de graças. Porque voçês podem estar certos disto: nenhum imoral, ou imputo, ou ganancioso , que é idólatra, tem herança no Reino de Cristo e de Deus. Ninguém os engane com palavras tolas, pois é por causa dessas coisas que a ira de Deus vem sobre os que vivem na desobediência (Ef. 5:3-6, ênfase adicionada).

Se Paulo acreditasse que a graça de Deus salvaria no final qualquer pessoa não-arrependida que fosse imoral, impura ou gananciosa, ele nunca teria escrito essas palavras. O significado intencionado das palavras de Paulo gravadas em Efésios 2:8-9, só pode ser entendido corretamente dentro do contexto da carta inteira aos Efésios.

O Fiasco da Galácia (The Galatian Fiasco)

As palavras de Paulo em sua carta aos gálatas têm sido interpretadas similarmente fora de seu contexto. O resultado tem sido a distorção do evangelho, exatamente o que Paulo tentava corrigir em sua carta aos gálatas.

O tema completo da carta de Paulo aos gálatas é “Salvação por meio da fé e não por obras da Lei.” Mas Paulo planejava que seus leitores concluíssem que santidade não era necessária para entrar no reino de Deus? Certamente nãp.

Primeiramente, notamos que Paulo estava mais uma vez combatendo judeus que foram à Galácia e estavam ensinando os novos convertidos que não poderiam ser salvos, a menos que fossem circuncidados e obedecessem a Lei de Moisés. Paulo menciona o assunto da circuncisão repetidamente em sua carta, já que essa parece ter sido a ênfase principal dos judeus legalistas (veja Gl. 2:3, 7-9, 12; 5:2-3, 6, 11; 6:12-13, 15). Paulo não estava preocupado que os convertidos de Galácia estavam muito obediêntes aos mandamentos de Cristo, ele estava preocupado porque eles não estavam colocando sua fé em Cristo para sua salvação, e sim em circuncisão e seus próprios fracos esforços em manter a Lei Mosaica.

Quando consideramos todo o contexto da carta de Paulo aos gálatas, percebemos que ele escreve no capítulo 5:

Mas, se vocês são guiados pelo Espírito, não estão debaixo da Lei. Ora, as obras da carne são manifestas: imoralidade sexual, impureza e libertinagem; idolatria e feitiçaria; ódio, discórdia, ciúmes, ira, egoísmo, dissensões, facções e inveja; embriaguez, orgias e coisas semelhantes. Eu os advirto, como antes já adverti: Aqueles que praticam essas coisas não herdarão o Reino de Deus (Gl. 5:18-21, ênfase adicionada).

Se Paulo quisesse dizer aos gálatas que poderiam não ser santos e entrar no céu, ele não teria escrito essas palavras. Sua mensagem não é que pessoas não-santas poderiam ir para o céu, mas que aqueles que anulam a graça de Deus e o sacrifício de Cristo tentando adqurir a salvação pela circuncisão e pela Lei de Moisés não podem ser salvos. Não é a circuncisão que trás a salvação. É a fé em Jesus que resulta na salvação que muda salvos em novas criações santas.

De nada vala ser circuncidado ou não. O que importa é ser uma nova criação (Gl. 6:15).

Novamente, tudo isso mostra quão vital é que consideremos o contexto quando interpretamos as Escrituras. A única forma que o evangelho pode ser distorcido por meio da Palavra de Deus é ignorando o contexto. Só podemos nos espantar com os corações de “ministros” que fazem isso de forma tão rude que não pode ser outra coisa se não intencionado.

Por exemplo, uma vez eu ouvi um pregador dizer que nunca devemos mencionar a ira de Deus quando estivermos pregando o evangelho, poque a Bíblia diz que “a bondade de Deus leva ao arrependimento” (Rm. 2:4). Portanto, de acordo com ele, a maneira certa de pregar o evangelho era falar somente do amor e da bondade de Deus. Isso, supostamente, levaria as pessoas a se arrependerem.

Mas quando lemos o contexto do versículo solitário que o pastor mencionou do segundo capítulo de Romanos, descobrimos que ele está envolvido de passagens sobre o julgamento e a ira santa de Deus! O contexto imediato revela que não há possibilidade alguma que a intenção de Paulo era o que o pastor disse que é:

Sabemos que o juízo de Deus contra os que praticam tais coisas é conforme a verdade. Assim, quando você, um simples homem, os julga, mas pratica as mesmas coisas, pensa que escapará do juízo de Deus? Ou será que você despreza as riquezas da sua bondade, tolerância e paciência, não reconhecendo que a bondade de Deus o leva ao arrependimento? Contudo, por causa da sua teimosia e do seu coração obstinado, você está acumulando ira contra si mesmo, para o dia da ira de Deus, quando se revelará o seu justo julgamento; Deus “retribuirá a cada um conforme o seu procedimento”. Ele dará vida eterna aos que, persistindo em fazer o bem, buscam glória, honra e imortalidade. Mas haverá ira e indignação para os que são egoístas, que rejeitam a verdade e seguem a injustiça. Haverá tribulação e angúnstia para todo ser humano que pratica o mal: primeiro para o judeu, depois para o grego (Rm. 2:22-9, ênfase adicionada).

A referência de Paulo a bondade de Deus é a bondade que Deus mostra ao adiar Sua ira! Só podemos nos perguntar como um ministro pode falar uma coisa tão absurda à luz do contexto maior da Bíblia, que está cheia de exemplos de pregadores que advertiram publicamente os pecadores se arrependerem.

A Consistência das Escrituras (Scripture’s Consistency)

Porque a Bíblia é inspirada por apenas uma (só) Pessoa, sua mensagem é consistente. É por isso que podemos confiar no contexto para nos ajudar a interpretar o significado planejado por Deus em qualque passagem. Deus não diria uma coisa em um versículo que contradiria outro, e se parece dessa forma, devemos contunuar estudando até que nossa interpretação dos dois versículos fique em harmonia. Por exemplo, em vários lugares no Sermão do Monte de Jesus, pode parecer que Ele estava contradizendo, e até corrigindo uma lei moral do Velho Testamento. Por exemplo:

Vocês ouviram o que foi ditto: “Olho por olho e dente por dente.” Mas eu lhes digo: Não resistam ao perverso. Se alguém o ferir na face esquerda, ofereça-lhe tembém a outra (Mt. 5:38-39).

Jesus citou diretamente da Lei de Moisés e então disse uma coisa que parecia contradizer a lei que acabara de citar. Como devemos interpretar o que Ele disse? Deus mudou de ideia em um assunto de moralidade básica? Buscar vingança era uma coisa aceitável no Velho Testamento mas não no Novo? É o contexto que irá nos ajudar.

Jesus estava falando principalmente com Seus discípulos (veja Mt. 5:12), pessoas a quem a única exposição a Palavra de Deus foi através dos escribas e fariseus que ensinavam nas sinagogas. Ali, eles haviam ouvido a lei de Deus citada, “Olho por olho e dente por dente,” um mandamento que os escribas e fariseus tinham torcido ignorando seu contexto. Deus não tinha a intenção de que esse mandamento fosse interpretado como um requerimento para Seu povo sempre se vingar por pequenos erros. Aliás, Ele disse na Lei de Moisés que a vingança pertencia a Ele (veja Dt. 32:35), e que Seu povo devia fazer o bem aos seus inimigos (veja Ex. 23:4-5). Mas os escribas e fariseus ignoraram esses mandamentos e inventaram sua própria interpretação da lei de Deus de “olho por olho,” uma que os dava o direito à vingança pessoal.[3] Eles ignoraram o contexto.

O mandamento de Deus de “olho por olho e dente por dente” é encontrado dentro do contexto dos mandamentos que prescrevia a justiça do tribunal de Israel (veja Ex. 21:22-24; Dt. 19:15-21). Promover um sistema de corte judicial é em si mesmo uma revelação da desaprovação de Deus quanto a vingaça pessoal. Juízes imparciais que examinam provas são muito mais capazes de administrar a justiça que pessoas envovidas e ofendidas. Deus espera que juízes vão dar o punimento que o crime merece. Portanto, “olho por olho e dente por dente.”

Portanto, podemos entender o que a primeira vista parece contraditório. Jesus estava simplesmente ajudando Seu público, pessoas que tinham recebido ensinamentos errados por toda vida, a entender a verdadeira vontade de Deus a respeito da vingança pessoal, uma coisa que já tinha sido revelada na Lei de Moisés, mas tinha sido distorcida pelos fariseus. Jesus não estava contradizendo a lei que Ele tinha dado a Moisés. Ele só estava revelando seu significado original.

Isso também nos ajuda a entender corretamente que Jesus espera de nós a respeito de disputas maiores, o tipo que pode levar ao trubunal. Deus não esperava que os israelitas se vingassem de cada ofensa sofrida, caso contrário ele não teria estabelecido um sistema de corte. Da mesma forma, Deus não espera que cristãos queiram se vingar de qualquer ofensa sofrida de seus irmãos (ou próximos). O Novo Testamento diz que cristãos que não se reconciliam devem buscar ajuda mediadora de outros companheiros (veja 1 Co. 6:1-6). E não há nada de errado com um crente levar um ímpio a cortes judiciais a respeito de disputas de ofensas maiores. Ofensas maiores são coisas do tipo ter seu olho ou dente arrancado! Ofensas menores são os tipos de coisa que Jesus falou, com levar um tapa no rosto, ou ser processado por uma coisa pequena (tipo uma camisa), ou ser forçado a andar uma milha. Deus quer que Seu povo O imite e mostre graça extraordinária a pecadores imprudentes e pessoas más.

Nessas mesmas linhas, existem alguns crentes bem intencionados que, pensando estar obedecendo a Jesus, se recusam a denunciar aqueles que foram pegos roubando deles. Eles acham que estão “oferencendo a outra face,” quando na verdade estão permitindo que o ladrão roube mais uma vez, ensinando-o que não há consequências pelo crime. Tais cristãos não estão mostrando amor pelas pessoas que serão roubadas por esse mesmo ladrão! Deus quer que ladrões sofram a justiça e que se arrependam. Mas quando alguém lhe ofender por algo sem importância, como lhe dar um tapa no rosto, não o leve para o tribunal ou bata no rosto dele. Mostre misericórdia e amor.

Interpretando o Velho à Luz do Novo (Interpreting the Old in Light of the New)

Não devemos somente interpretar o Novo Testamento à luz do Velho Testamento, mas também o Velho à luz do Novo. Por exemplo, alguns cristãos sinceros leram as leis de Moisés referentes as restrições alimentares e concluíram que cristãos devem restringir suas dietas de acordo com aquelas leis. Contudo, se eles lessem apenas duas passagens do Novo Testamento, descobririam que essas leis de Moisés não se aplicam àqueles que estão debaixo da Nova Aliança.

“Será que vocês também não conseguem entender?”, perguntou-lhes Jesus. “ Não percebem qua nada que entre no homem pode pode torná-lo ‘impuro’? Porque não entra em seu coração, mas em seu estômago, sendo depois eliminado.” Ao dizer isso, Jesus declarou “puros” todos os alimentos (Mc. 7:18-19).

O Espírito diz claramente que nos últimos tempos alguns abandonarão a fé e seguirão espíritos enganadores e doutrinas de demônios. Tais ensinamentos vêm de homens hipócritas e mentirosos, que têm a consciência cauterizada e proíbem o casamento e o consumo de alimentos que Deus criou para serem recebidos com ação de graças pelos que crêem e conhecem a verdade. Pois tudo o que Deus criou é bom, e nada deve ser rejeitado, se for recebido com ação de graças, pois é santificado pela palavra de Deus e pela oração (1 Tm. 4:1-5).

Debaixo da Nova Aliança, não somos sujeitos a Lei de Moisés, mas a Lei de Cristo (veja 1 Co. 9:20-21). Mesmo que Jesus tenha confirmado os aspectos morais da Lei de Moisés (incorporando-as a Lei de Cristo), nem Ele nem os apóstolos ensinaram que os cristãos eram obrigados a manter as leis alimentares de Moisés.

Contudo, é bem claro que os primeiros cristãos, todos judeus convertidos, continuaram a manter a dieta do Velho Testamento por causa de convicções culturais (veja At. 10:9-14). E quando quando os gentils começaram a acreditar em Jesus, os primeiros cristãos judeus os pediram para seguir as leis de Moisés referentes as restrições alimentares simplesmente por consideração aos vizinhos judeus, que caso contrário pudessem se ofender (veja At. 15:1-21). Portanto, não há nada de errado em cristãos manterem essas leis de Moisés, desde que não confiem que manter essas leis é que os salva.

Alguns dos primeiros cristãos também estavam convencidos que era errado comer carnes que haviam sido sacrificadas a ídolos. Paulo instruiu os crentes que pensavam de outra forma (como ele) a andarem em amor com seus irmãos “fracos na fé” (veja Rm. 14:1), fazendo nada que os cause a violar suas consciências. Se alguém se abstem de comer certas coisas por convicção diante de Deus (mesmo que essas convições não tenham base), essa pessoa deve ser elogiada por sua devoção, não condenada por sua falta de entendimento. Do mesmo modo, aqueles que se abstem de certas comidas por convicção própria não devem julgar aqueles que não se abstem. Ambos os grupos devem andar em amor um para com o outro, já que Deus ordenou que isso fosse feito (veja Rm. 14:1-23).

De qualquer modo, porque a Bíblia é uma revelação progressiva, devemos sempre interpretar a revelação mais velha (o Velho Testamento) sob a luz da revelação mais nova (o Novo Testamento). Nenhuma das revelações que Deus dá é contraditória, é sempre complementar.

Contexto Histórico e Cultural (Cultural and Historical Context)

Sempre que possível, devemos considerar o contexto hitórico e cultural da passagem que estamos estudando. Ter alguma coisa em mente sobre aspectos únicos da cultura, geografia e história de um ambiente bíblico pode nos ajudar a ter um ponto de vista que caso contrário teríamos perdido. É claro que isso requer ajuda de outros livros além da Bíblia. Uma boa Bíblia de estudos normalmente terá informações dessa área.

Aqui estão alguns exemplos de como informações hitóricas e culturais podem nos ajudar a não nos confudir quando estivermos lendo a Bíblia:

1. Às vezes, lemos nas Escrituras de pessoas subindo em telhados (veja At. 10:9) ou fazendo buracos no telhado (veja Mc. 2:4). Ajuda a entender saber que os telhados eram normalmente planos em Israel nos tempos da Bíblia e havia escadas do lado de fora da maioria das casas que levavam a esses telhados planos. Se não soubermos disso podemos imaginar um personagem bíblico se arrastando pelo telhado e se agarrando a uma chaminé!

2. Lemos em Marcos 11:12-14 que Jesus amaldiçoou uma figueira por ela não ter figos, mesmo assim “não era tempo de figos.” Ajuda saber que figueiras normalmente têm alguns figos mesmo fora de época, portanto, Jesus não estava sendo irracional em suas expectações.

3. Lemos em Lucas 7:37-48 sobre uma mulher que entrou na casa de um fariseu onde Jesus estava jantando. As Escrituras dizem que ela ficou atrás de Jesus chorando e começou a molhar Seus pés com suas lágrimas, limpá-las com seus cabelos, beijar e ungir Seus pés com perfume. Nos perguntamos como tal coisa pode acontecer enquando Jesus estava sentado em uma mesa comendo. Ela engatinhou por baixo ba mesa? Como ela conseguiu passar pelas pernas de todos os outros convidados?

A resposta é encontrada na frase de Lucas que Jesus “reclinou-se à mesa” (Lc. 7:36). O modo costumeiro de se comer naqueles dias era se deitar de lado no chão ao redor de uma mesa baixa, se lavantando com um dos braços e se alimentanto com a outra mão. Nessa posição Jesus foi adorado pela mulher.

Uma Pergunta Comum Sobre Roupas (A Common Question About Clothes)

Uma pergunta que pastores ao reador do mundo sempre me fazem é: “É aceitável que mulheres cristãs usem calças, considerando que a Bíblia proíbe que mulheres usem roupas de homens?”

Essa é uma boa pergunta que podemos responder aplicando algumas regras de interpretação e um pouco de contexto cultural.

Primeiramente, vamos examinar a proibição da Bíblia contra mulheres usarem roupas de homens (e vice-versa):

A mulher não usará roupas de homem, e o homem não usará roupas de mulher, pois o Senhor, o seu Deus, tem aversão por todo aquele que assim procede (Dt. 22:5).

Devemos começar perguntando: “Qual foi a intenção de Deus ao dar esse mandamento?” O objetivo dEle era de não deixar mulheres usarem calças?

Não, essa não poderia ter sido Sua intenção, porque nenhum homem em Israel usava calças quando Deus disse isso originalmente. Calças não eram consideradas roupas de homem ou de qualquer um. Aliás, o que os homens usavam nos tempos bíblicos pareceria mais roupas de mulheres para a maioria de nós hoje! Isso é um pouco de informação histórica e cultural que nos ajuda a interpretar corretamente o que Deus estava tentando dizer.

Então qual era a intenção de Deus?

Lemos que qualquer um que usasse roupas do sexo oposto era uma abominação ao Senhor. Isso parece bem sério. Se um homem pegar o véu de uma mulher e colocá-lo na cabeça por três segundos ele vira uma abominação ao Senhor? Parece muito duvidável.

Seria mais provável que a oposição de Deus era para com pessoas que se vestiam para parecer propositalmente do sexo oposto. Por que alguém faria tal coisa? Só porque ele ou ela estaria esperando seduzir alguém do mesmo sexo, uma perversão sexual chamada travestismo. Acho que podemos como isso pode ser considerado uma abominação para Deus.

Portanto, ninguém pode concluir que mulheres não podem usar calças se baseando de Deuteronômio 22:5, a menos que ela esteja fazendo isso como travesti. Ela não estará pecando por usar calças, desde que ela ainda pareça mulher.

É claro que as Escrituras esinam que mulheres devem se vestir modestamente (veja 1 Tm. 2:9), portanto, calças justas e reveladoras não são apropriadas (assim como vestidos e saias justas) pois podem levar homens à cobiça. Muitas das roupas que mulheres usam publicamente em países ocidentais são completamente inapropriadas e são roupas que somente prostitutas usam em países em desenvolvimento. Nenhuma mulher cristã deve usar roupas publicamente com o intuito de parecer “sexy.”

Algumas Outras Ideias (A Few Other Thoughts)

É interessante que nenhum pastor da China tenha me perguntado sobre mulheres usando calças. É provável que seja porque a maioria das mulheres chinesas tem usado calças por um longo tempo. Somente pastores de países em que a maioria das mulheres não usa calça me fazem essa pergunta. Isso mostra o preconceito pessoal com relação as suas culturas.

Também me parece interessante que nenhuma pastora de Mianmar me tenha feito pergunta semelhante. Mianmar é um lugar onde homens tradicionalmente usam o que chamamos de saia, mas o que eles chaman de longgi. Novamente, o que constitui roupas de homens e mulheres varia de cultura para cultura, então precisamos tomar cuidado para não forçar nossa cultura no entendimento da Bíblia.

Finalmente, eu me pergunto por que tantos homes que esperam que mulheres não usem calças baseando-se em Deuteronômio 22:5 não se sentem obrigados a aplicar em si mesmos Levítico 19:27, que diz:

Não cortem o cabelo dos lados da cabeça, nem aparem as pontas da barba (Lv. 19:27).

Como homens que desobedecem Levítico 19:27, e raspam completamente suas barbas dadas por Deus, barbas que os distinguem claramente de mulheres, podem acusar mulheres que usam calças de tentar parecer homens? Parece meio hipócrita!

A propósito, um pouco de informação histórica nos ajuda a entender a intenção de Deus em Levítico 19:27. Arredondar o cabelo dos lados da babeça era parte de um ritual idólatra pagão. Deus não queria que Seu povo parecece devoto a ídolos pagãos.

Quem está Falando? (Who is Speaking?)

Sempre devemos notar quem está falando em qualquer passagem bíblica, já que essa pequena informação contextual nos ajudará a interpretá-la corretamente. Mesmo que tudo na Bíblia tenha sido inspirado para estar na Bíblia, nem tudo da Bíblia é a inspirada Palavra de Deus. O que eu quero dizer?

As palavras não-inspiradas de pessoas estão gravadas em muitas passagens das Escrituras. Portanto, não devemos pensar que tudo dito por pessoas na Bíblia é inspirado por Deus.

Por exemplo, alguns cometem o erro de citar as palavras de Jó e seus amigos como se fossem inspiradas por Deus. Existem dois motivos de porque isso é um erro. Primeiro, Jó e seus amigos discutiram por trinta e quatro capítulos. Eles não concordaram. Obviamente, nem tudo que disseram pode ser a Palavra inspirada de Deus porque Deus não se contradiz.

Segundo, no fim do livro de Jó, Deus fala e repreende tanto a Jó quanto seus amigos por dizerem coisas incorretas (veja Jó 38-42).

Devemos tomar as mesmas preucações quando lermos o Novo Testamento. Em vários casos, Paulo diz claramente que certas partes de suas cartas eram somente suas opniões (veja 1 Co. 7:12, 25-26, 40).

Quem está Sendo Endereçado? (Who is Being Addressed?)

Não devemos nos perguntar somente quem está falando em qualquer passagem bíblica, também devemos notar quem está sendo endereçado. Se não, podemos interpretar mal alguma coisa pensando que é aplicável a nós quando não é. Ou podemos interpretar alguma coisa como não sendo aplicável a nós quando é.

Por exemplo, reivindicam a promessa encontrada em Salmo 37, acreditando que se aplica a eles:

Ele atenderá os desejos do seu coração (Salmo 37:4).

Mas essa promessa se aplica a todos que a leem ou a conhecem? Não, se lermos o contexto, descobrimos que ela só se aplica a certas pessoas que encontram cinco condições.

Confie no Senhor e faça o bem; assim você habitará na terra e desfrutará segurança. Deleite-se no Senhor, e ele atenderá aos desejos do seu coração (Sl. 37:3-4).

Então vemos quão importante que notemos quem está sendo endereçado.

Aqui está outro exemplo:

Entrão Pedro começou a dizer-lhe: “Nós deixamos tudo para seguir-te”. Respondeu Jesus: “Digo-lhes a verdade: Ninguém que tenha deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, ou campos, por causa de mim e do evangelho, deixará de receber cem vezes mais, já no tempo presente, casas, irmãos, irmãs, mães, filhos, e campos, e com eles perseguição; e, na era futura, a vida eterna. Contudo, muitos primeiros serão últimos, e os últimos serão primeiros” (Mc. 10: 28-30).

É bem popular em alguns círculos reivindicar o “cem vezes mais” quando dão dinheito para sustentar alguém que está pregando o evangelho. Mas essa promessa se aplica a tais pessoas? Não, ela é endereçada a pessoas que realmente deixam suas famílias, terrenos ou casas para pregar o evangelho, assim como Pedro, que perguntou a Jesus qual seria sua recompensa e dos outros discípulos.

Interessantemente, aqueles que sempre pregam sobre a recompensa de cem vezes mais tendem a focalizar principalmente nas casas e terrenos, e nunca nos filhos e perseguições que também foram prometidos! É claro que Jesus não estava falando que aqueles que deixam suas casa receberão escrituras de cem casas em troca. Ele estava prometendo que quando eles deixarem suas famílias e casas, os membros de suas novas famílias espirituais abrirão suas casas para alojamento. Verdadeiros discípulos não se importam com propriedades porque sabem que não têm posse de nada — são somente mordomos daquilo que é de Deus.

Um Exemplo Final (A Final Example)

Quando pessoas leem o que é conhecido como o “Sermão das Oliveiras” de Jesus, encontrado em Mateus 24-25, alguns acham erroneamente que Ele estava falando com ímpios, e portanto concluem que o que Ele diz não tem aplicação a elas. Elas leem as parábolas do Servo Mau e a parábola das Dez Virgens como se fossem endereçadas a ímpios. Mas como já disse antes, ambas foram endereçadas aos discípulos mais íntimos de Jesus (veja Mt. 24:3; Mc. 13:3). Portanto, se Pedro, Tiago, João e André precisavam ser advertidos da possibilidade de não estarem preparados para a volta de Jesus, nós também precisamos. O aviso do Sermão das Oliveiras de Jesus também pode ser aplicado a todos os crentes, mesmo aqueles que não pensam assim por não perceberem a quem Jesus estava falando.

Regra no3 Leia Honestamente. Não force sua teologia dentro do texto. Se você ler alguma coisa que contradiz o que acredira, não tente mudar a Bíblia; mude o que você acretida.

Todos abordamos as Escrituras com algumas inclinações. Por esse motivo, muitas vezes é difícil lermos a Bíblia honestamente. Nós acabamos forçando nossas crenças nas Escrituras, ao invés de deixá-la moldar nossa teologia. Ás vezes até procuramos passagens que sustentem nossas doutrinas, ignorando aquelas que contradizem nossas crenças. Isso é conhecido como “texto-prova.”

Aqui está um exemplo que encontrei recentemente de teologia forçada em um texto. Um professor em particular leu primeiro Mateus 11:28-29, uma frase bem conhecida de Jesus:

Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. Tomem sobre vocês o meu julgo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas (Mt. 11:28-29).

O professor explicou que Jesus estava oferecendo dois tipos de descanso. O primeiro (supostamente) é o resto da salvação no 11:28, e o segundo é o descanso do discipulado no 11:29. O primeiro é recebido vindo a Jesus; o segundo é recebido se submetendo a Ele como Senhor, ou tomando Seu jugo.

Mas era essa a intenção de Jesus? Não isso é forçar um significado no texto que não foi declarado ou indicado. Jesus não disse que estava oferecendo dois descansos. Ele estava oferecendo um descanso para aqueles que estão cansados e sobrecarregados, e o único modo de receber esse único descanso é tomando o jugo de Jesus, que é submetendo-se a Ele. Esse é a intenção óbvia de Jesus.

Porque aquele professor propôs tal interpretação? Porque o significado óbvio da passagem não encaixa em sua crença de que existem dois tipos de crentes merecedores do céu — os crentes e os discípulos. Portanto, ele não interpretou essa passagem honestamente.

É claro, como vimos várias passagens nesse livro enquanto considerávamos essa teologia em particular, a interpretação daquele professor não encaixa no contexto das outras coisas que Jesus ensinou. Em lugar algum o Novo Testamento ensina que existam dois tipos de cristãos merecidos do céu, os crentes e os discípulos. Todos verdadeiros crentes são discípulos. Aqueles que não são discípulos não são cristãos. Discipulado é o fruto da fé genuína.

Vamos fazer o possível para ler a Bíblia honestamente, com corações puros. Se fizermos isso, o resultado será mais devoção e obediência a Cristo.


[1] Obviamente, Paulo não acreditava em segurança eterna incondicional, caso contrário ele não teria dita a Timóteo, uma pessoa salva, que precisava fazer algo para que assegurasse sua salvação.

[2] Moisés também viu as costas de Deus enquanto Ele passava. Deus posicionou Sua mão de forma que Moisés não pode ver Sua face; veja Êxodo 33:18-23.

[3] Também deve ser notado que Jesus disse mais cedo em Seu sermão que a menos que a santidade de Sua audiência ultrapassasse a dos escribas e fariseus, eles não entrarian no céu (veja Mt. 5:20). Então Jesus continuou mostrando várias coisas específicas que os escribas e fariseus estavam fazendo de forma errada.